quinta-feira, 9 de julho de 2020


Pesquisa de campo do Grupo de Gastronomia Recife Pernambuco sobre o molusco totó nos manguezais de Ipojuca indica declínio da espécie

No dia 9 de janeiro de 2018, meu amigo cozinheiro Joaquim Neto me perguntou se eu conhecia a moqueca de totó, ou seja, se eu conhecia o molusco totó (Fulguropsis sp). Depois desta conversa e com tempo aqui em Ipojuca, fiquei pensando depois que assisti ao vídeo, retornei para ele e disse que sim, mais fazia tempo. Falei que comia muito quando morava em Salgadinho, Bairro de Olinda em 1974. Ainda jovem, adorava ir pescar no manguezal perto da Praia do Del Chifre, atrás da Escola de Aprendizes-Marinheiros de Pernambuco. Mas hoje a realidade dessa praia, depois de 30 anos que foi invadida pelas águas de esgotos da cidade do Recife, que não cuida bem desta parte, a poluição é observada por todo manguezal. (Lôbo, Marcos 1974). Tudo isso me fez pensar na iniciativa de fazer uma pesquisa rápida, para saber como estão os mangues de Ipojuca.

Fotos: Marcos Lôbo / Acervo pessoal









Nas minhas ida e vindas, trazia de tudo que podia cozinhar e comer. Sempre vinha comigo guaiamuns, caranguejos, ostras, camarões, peixes de várias espécies, mariscos, siris e o molusco totó. Também disse ao jovem cozinheiro que lá, eu e meus amigos de adolescência, olhávamos muitos cavalos-marinhos e tudo que havia no mangue. 





Sair em busca do molusco totó no dia 15 de janeiro de 2018 em todas as partes do manguezal que podia ter acesso. Não acreditei em tudo que estava vendo nessas três semanas de pesquisas. Relatei que as empresas imobiliárias, a estação de esgoto e as construções irregulares estão matando o manguezal de Ipojuca lentamente. Quando observo o lixo nesse ecossistema entre a vegetação aquática, é possível ver o tamanho do problema que vem pela frente. Hoje não se encontra mais caranguejos, nem mariscos, e ostras de boa qualidade e acho que não se encontra mais nada nesse manguezal confiável para ser ingerido em nosso cardápio. 




A ação tem uma reação e encontrar o molusco totó aqui em Ipojuca está sendo uma tarefa difícil, a poluição é vista por toda parte e me questiono quando vou poder comer de novo uma moqueca do molusco totó.    



Tudo isso me fez pensar todos esses dias da minha procura e o por que um chef de cozinha se preocupa com isso. Trabalhamos com os estômagos dos comensais e sabemos que ingerir um ingrediente do mar de péssima qualidade pode ocasionar uma reação fatal para a saúde.

Mas será que já saímos do conforto de nossas cozinhas em busca de saber onde há comunidades de marisqueiras e como o trabalho delas é importante, para que o nosso seja considerando o melhor?







Fui saber como elas trabalham e não é fácil, madruguei para chegar à beira da maré poluída e morrendo, coletando siris, mariscos, ostras, caranguejos e depois levar para associação e conhecer o processo de tratar, lavar, cozinhar, retirar da casca e depois vender.

Se reservar um dia para fazer este percurso com elas, vocês serão testemunhas que não é um trabalho fácil. Perguntei se todas conheciam o molusco totó e me responderam: “Você tem uma foto?” Ao mostrar a foto à resposta foi quase unanime, ninguém conhecia o molusco totó e nem sabia que era de comer. 










Depois de duas semanas, quebrando a cabeça de ida e vindas do mangue e quase desistindo, me lembrei de um aluno que fez o projeto jovem legal comigo e que o pai dele é pescador das antigas e foi uma luz para tudo que precisava ouvir. Liguei para ele e Gustavo disse que tinha sim, próximo da camboa, um local em que na maré alta, ele e seu pai viam sempre os molusco totós nas arvores do mangue. Fiquei feliz com a notícia e marcamos para ir até lá comprovar que o animal ainda existia em Ipojuca e que se poderia fazer uma ação de conservação e uso sustentável.

Pesquisando na internet, descobri que sempre houve preocupação da população em fazer ações para proteger o manguezal. E sempre entra governo e sai governo e a ações são momentâneas. Pena que não são contínuas essas ações, pois com o futuro impedimento de se pescar o guaiamu e outros seres vivos do mangue, como será a vida das pessoas que trabalham na associação das marisqueiras? 


Agora eu pergunto novamente como chef de cozinha: Como vamos da continuidade a nossos pratos de fruto do mar que são apreciados por todos desta forma, se não conservarmos o bem maior que é o manguezal? Palavras são duras e ver projeto entrar e sair toda hora não vai salvar o molusco totó, demais seres e seu ambiente.



Chef Marcos Lôbo
Whatsapp: (81) 99788 6975

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